O modo do presidente Jair Bolsonaro (PL)
digerir a notÃcia de derrota nas eleições é um sinal de que não facilitará a
vida do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e, ao contrário do
que disse anteriormente sobre um recolhimento, se colocará como a maior
liderança de oposição da gestão. Em seu discurso mais de 44 horas após a
apuração das urnas, Bolsonaro apontou a nova bancada formada, com 99 deputados
e 14 senadores, e destacou que sob seu comando "a direita nasceu de
verdade" e que os "sonhos seguem mais vivos que nunca".
Contudo, após perder o foro privilegiado como
presidente no ano que vem, Bolsonaro poderá enfrentar problemas na Justiça,
como a suspensão do sigilo de 100 anos, prometida pelo oponente, o que pode
prejudicar sua influência polÃtica. O presidente é investigado em quatro
inquéritos que podem ir à primeira instância relacionados à s milÃcias digitais,
suposta intervenção na PolÃcia Federal, disseminação de notÃcias falsas na
pandemia e o vazamento de dados de uma investigação sigilosa da PF sobre
suposto ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em uma live.
Desde o dia 30, Bolsonaro segue em clima de
luto pela perda da cadeira presidencial, mantendo-se recluso na maior parte do
tempo no Palácio da Alvorada. Também deixou de fazer as costumeiras lives e
encontros com apoiadores no "cercadinho", focando na articulação de
seu futuro. No começo do ano, deve assumir como presidente de honra do PL, que
bancará seu salário, assim como despesas de advogados e aluguel de uma casa em
BrasÃlia. O plano é que o presidente continue como um expoente influente e
possa se cacifar para concorrer à Presidência em 2026.
Usuário assÃduo das redes sociais, o
presidente se manifestou em apenas duas ocasiões desde a vitória de Lula,
postando o vÃdeo do pronunciamento após a derrota e pedindo que manifestantes
descontentes com o pleito desobstruÃssem as rodovias do paÃs. Nas poucas vezes
que saiu da residência oficial, foi ao Palácio do Planalto reunir-se com
aliados, ao Supremo Tribunal Federal (STF) e se encontrar com o vice-presidente
eleito, Geraldo Alckmin (PSB), para tratar sobre a transição de governo. Já uma
conversa em clima pacÃfico com Lula com direito a aperto de mãos ainda é
incerta.
O presidente nacional do PL, Valdemar Costa
Neto, que já foi aliado de Lula, concederá uma entrevista coletiva à imprensa
amanhã, às 14h, no Centro de Eventos e Convenções do Complexo Brasil 21, prédio
da sede do partido, em BrasÃlia. A expectativa é de que seja anunciada oposição
ao governo Lula, com a ressalva de uma "oposição responsável" em
pautas que ajudem o paÃs, como a continuidade do AuxÃlio Brasil em R$ 600.
O sociólogo e analista polÃtico Pedro Célio
analisa que, sob a gestão de Bolsonaro, o conservadorismo, antes envolto na
polÃtica tradicional, surgirá no Congresso com voz própria. "Essa é uma
das heranças dele, um elemento importante para que Bolsonaro se caracterize
como o porta-voz da oposição da direita ao governo Lula." Ele observa que
outro fator importante será o desempenho do governo petista, especialmente nas
polÃticas sociais e recuperação na área econômica, o que colocará Bolsonaro na
cola do novo presidente.
"Lula se comprometeu especialmente
nessas áreas. E essa pode ser uma área de atuação de Bolsonaro. Também ficou
evidente que o atual presidente teve problemas na gestão, tanto é que um dos
que o desgastou foi o do sigilo de 100 anos sobre a documentação envolvendo
procedimentos seus, de aliados e de familiares, especialmente durante a
pandemia. Ele deixará a Presidência com processos pendentes com previsão de que
eles terão desdobramento na polÃtica", disse.
O cientista polÃtico Rodrigo Prando,
professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, ressalta que Bolsonaro tem
forte capital polÃtico, mas que algumas variáveis podem mudar o jogo e que é
preciso ver se o presidente perderá a influência com o passar do tempo.
"Apesar disso, a força polÃtica dele vai depender da sua própria
articulação e de quanto os bolsonaristas que surgiram com ele vão continuar
próximos dele. Agora que ele não está no poder, podem se afastar e buscar eles
próprios se cacifar para ser a liderança da direita ou extrema direita no
paÃs", comentou.
Na visão de André César, cientista polÃtico, sócio da Hold Assessoria, após a derrota, Bolsonaro manterá a base eleitoral mobilizada. "Bolsonaro passa por sua própria transição, como polÃtico e ex-mandatário. Nessa saÃda de cena momentânea, ele buscará manter a base bolsonarista mobilizada mantendo esse fogo aceso, além do discurso de contraponto a Lula. Esses dois movimentos serão fundamentais para ele se colocar como o principal opositor", afirmou.
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