Ucrânia dispara pela primeira vez mísseis de longo alcance dos EUA contra a Rússia

A Rússia afirmou nesta terça-feira(19) que a Ucrânia disparou pela primeira vez em mil dias de guerra mísseis de longo alcance, os ATACMS, fornecidos pelos EUA contra o seu território, apenas dois dias após o governo de Joe Biden ter dado autorização. O disparo teria ocorrido contra uma instalação militar na região fronteiriça russa de Bryansk, segundo a imprensa estatal. Os fragmentos de um míssil danificado provocaram um incêndio na instalação, que foi rapidamente extinto e não causou danos ou vítimas. Um funcionário de alto escalão ucraniano confirmou à AFP o uso do mísseis, mas o governo ainda não fez uma declaração oficial. A Rússia disse que o ataque marca "uma nova fase" do conflito e prometeu uma resposta "adequada".

Dos seis, cinco mísseis foram abatidos, afirmou o Ministério da Defesa.

"Às 3h25 (21h15 de Brasília, segunda-feira), o inimigo atacou uma área na região de Bryansk com seis mísseis balísticos. Segundo dados confirmados, foram utilizados mísseis táticos ATACMS de fabricados americana", informaram as agências de notícias estatais, que citaram um comunicado militar.

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, não quis comentar o assunto durante uma coletiva de imprensa em Kiev. Mas a imprensa ucraniana, citando uma fonte militar, confirmou o uso dos mísseis fornecidos por Washington. À AFP, um alto funcionário ucraniano também confirmou o ataque, que teria causado 12 explosões secundárias.:

— O ataque à região de Bryansk foi realizado por mísseis ATACMS — disse a fonte.

Na segunda-feira, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, acusou a Ucrânia e o Ocidente de quererem uma escalada e prometeu uma resposta "adequada" a futuros ataques. No Brasil para a cúpula de líderes do G20, o chanceler russo afirmou que o lançamento marca "uma nova fase da guerra".

— Vamos encarar isso como uma fase qualitativamente nova da guerra ocidental contra a Rússia. E reagiremos de acordo — disse Lavrov, acusando antes Washington de ajudar Kiev a operar os mísseis: — Se há um lançamento de mísseis de longo alcance da Ucrânia até o território russo, quer dizer quer eles são operados por militares especialistas americanos.

O presidente dos EUA, Joe Biden, também presente no evento, instou os países presentes a apoiarem a soberania da Ucrânia.

Doutrina revisada

Mais cedo nesta terça-feira, o presidente russo, Vladimir Putin, assinou um decreto ratificando a doutrina nuclear revisada. O novo documento afirma que um ataque de um estado nuclear não nuclear, mas que é apoiado por uma potência nuclear, será tratado como um ataque conjunto. O Kremlin afirmou que a revisão era "necessária para adaptar os nossos fundamentos à situação atual".

A demanda pelo uso dos chamados Sistemas de Mísseis Táticos do Exército (ATACMS, em inglês) era um clamor antigo dos ucranianos. Mas Washington, um de seus principais aliados no conflito, vinha rejeitando as exigências, temeroso de que seu uso pudesse escalar ainda mais a guerra ou até significar uma diminuição no estoque de armamentos americano. Assim, quando os primeiros ATACMS foram enfim enviados à Ucrânia em 2023 com um alcance menor, de 160km, uma condição era a de que eles não fossem usados para ataque no território russo.

Nesta terça, o chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, pediu aos países do bloco que também permitissem que a Ucrânia usasse armas de longo alcance fornecidas para atacar alvos dentro da Rússia.

— Espero que todos os Estados-membros (da UE) sigam a decisão dos Estados Unidos — disse Borrell ao chegar para uma reunião de ministros da Defesa dos países do bloco em Bruxelas, concluindo: — A guerra contra a Ucrânia afeta diretamente nossos valores e princípios. O destino dos ucranianos determinará o destino da UE

Borrell também condenou a ameaça russa, classificando-a como "irresponsável". Argumentou que "a Rússia aderiu ao princípio de que uma guerra nuclear não pode ser vencida e, portanto, nunca deve ser travada."

Na mesma linha, o secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Mark Rutte, também presente na reunião, afirmou que é "crucial que Putin não consiga o que quer", uma vez que isso deixaria uma Rússia fortalecida nas fronteiras da Europa.

— Estamos prontos para fornecer o que for necessário à Ucrânia — declarou Rutte, para quem a Rússia representa "uma ameaça direta para todos nós no Ocidente".

Mil dias de guerra

O uso dos ATACMS pela Ucrânia e a revisão da doutrina nuclear russa ocorrem no mesmo dia que a guerra completa mil dias. O dia começou com um ataque russo na região fronteiriça ucraniana de Sumy, que matou sete pessoas, incluindo uma criança. O presidente Volodymyr Zelensky publicou um vídeo que mostra as equipes de resgate retirando corpos dos escombros e apelou aos seus aliados para "forçarem" a Rússia à paz.

Em declaração, Kiev afirmou que "nunca se submeterá aos ocupantes" e que "os militares russos serão punidos por violarem o direito internacional". "Alcançaremos a paz através da força e do apaziguamento", afirmou o Ministério das Relações Exteriores ucraniano em comunicado. A promessa faz referência aos crescentes apelos para que a Ucrânia se junte à mesa de negociações com a Rússia para acabar com quase três anos de guerra.

O Kremlin também prometeu derrotar a Ucrânia.

— A operação militar contra Kiev continua e será concluída — afirmou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, aos jornalistas.

A Ucrânia acusa as forças russas pelo uso de produtos químicos proibidos para avançar e instou seus aliados nesta terça a responder a um relatório da Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), que afirma ter encontrado um gás anti-distúrbios proibido na linha de frente.

"O uso de produtos químicos proibidos pela Rússia no campo de batalha demonstra mais uma vez o desrespeito crônico da Rússia pelo direito internacional", disse o Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia.

O Globo

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